SUICÍDIO


Um copo em cima da mesa e alguns minutos de angustia esperam pacientemente uma decisão difícil. Algumas horas antes, ali estava um coração cheio de esperanças por um futuro diferente, mas agora não resta muito o que esperar.

O copo continua ali, fitando os momentos de dor que rasgam o silêncio da noite. Em seu interior guarda-se o mais nobre e puro veneno, cuja única missão é dar um fim a tudo isso.

O tempo se arrasta pela madrugada e silenciosamente observa os gritos sufocados em sua garganta. Como quem ouve uma ópera, o relógio na parede do quarto permanece em silêncio apreciando cada instante de desespero.

Sentada na cama, ela leva as mãos ao rosto, secando as lágrimas que começam a escorrer - um choro contido e mudo. Levanta-se, movendo os pés tão delicada e lentamente que o assoalho não emite som. A cada passo se lembra dos míseros momentos felizes que presenciou em sua existência.

Caminha vagarosamente até a mesa no canto do quarto. Ao lado do copo, havia um livro de capa preta que estava aberto em uma página qualquer. Ingenuamente, ela procura algo que pudesse amenizar sua dor. Tenta encontrar nas páginas amareladas aquilo que ninguém nunca havia lhe dito. Porém o destino faz mais uma de suas brincadeiras de mau gosto - o livro que poderia ser a sua única salvação a fere com as palavras mais cortantes que poderiam ser ditas naquele momento:

“Exausto, em meio a corpos e sentindo o cheiro podre da carne em decomposição, o soldado se retira do campo de batalha, segurando em uma mão a carta de sua amada e na outra a arma responsável por parte daquele mórbido cenário. Ele sabia que a guerra não havia terminado e que o inimigo voltaria mais forte, mas já estava cansado da batalha. Ele havia aprendido que o maior vencedor é aquele que sabe perder...”.

As lágrimas caiam tão intensamente de seus olhos que tornou-se impossível continuar lendo. Se senta à cama e pega-se lembrando de sua adolescência: um grande amor, uma gravidez não desejada, a rejeição de seus pais, o abandono do amado. A gravidez de risco, a luta pela sobrevivência de seu primeiro e único filho. Enfrentou o mundo para ter essa criança para seis anos depois enterrá-la a sete palmos, como se ela nunca tivesse existido. Foi brutal para ela ver o motivo de tudo aquilo sendo fechado eternamente num tumulo...

Segura com as mãos tremulas o fiel copo que permanecia a esperando, respira profundamente fazendo com que seu corpo sinta o ar pela ultima vez. Em sua mente ecoava as risadas que seu filho nunca deu, suas lembranças destacavam os momentos felizes que os dois nunca tiveram. Em seu coração a dor havia se tornado tão intensa, que anestesiava até mesmo a dor física vinda dos cortes em seu braços, mais uma de suas tentativas sem sucesso.

Lentamente ela esvazia a mente e vira em apenas um gole todo o conteúdo do copo. Usa seus últimos instantes antes do veneno fazer efeito para dar uma última olhada pelo quarto - uma espécie de despedida daquele que nos últimos dias havia sido seu único refúgio.

Aos poucos seu corpo vai ficando pesado, mas nada que se comparasse ao fardo que ela havia carregado por todos esses anos. Seus olhos começam a se fechar, como se quisessem compensar todas as suas noites de insônia. Por fim, seu corpo cai sobre o chão frio. Ela se despede do mundo sem muita cerimônia: sem amigos pra lhe dizer adeus, sem um amor que pudesse lhe dizer “sentirei sua falta”. Um adeus silencioso, sem incomodar o mundo que sempre a julgou e cobrou tanto. Talvez ela encontre seu pequeno do outro lado. Talvez consiga mais que isso. Quem sabe agora ela tenha a paz que esse mundo nunca lhe pode dar...
Aline Alves e Thiago Lamas

2 comentários:

  1. Esse texto é lindo siim ou claro? *-*
    Claaro, Aline e Thi tão de parabéns, textos mais que lindos *-*, se escrevessem um livro, seria a primeira a comprar! u.u

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  2. Olha! Que legal que vc tá curtindo! Tô muito feliz, Amy! Divulga pra gente, pufavô! Bjão!

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